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terça-feira, 1 de outubro de 2019

A Montanha II

Olá,

Aprendei a amar a montanha.
É o livro por excelência, diante do qual qualquer livro
humano é pequeno.
Aprendei a ver, a ler, a ouvir. Ampliai
vossos olhos e vossos corações com essas paisagens agrestes
ou encantadoras. Penetrai-lhes a graça e a força, a severidade
e a doçura. Alternadamente, a árvore antiga e venerável, a
torrente tagarela, o cume altaneiro vos dirão lições sublimes,
que permanecerão gravadas para sempre na vossa memória e
embalarão, mais tarde, com suaves recordações os dias tristes
e escurecidos do vosso declínio.
Sabei compreender sua linguagem.
Suas vozes unidas compõem o hino de adoração que
os seres e as coisas cantam ao Eterno.
A montanha é uma bíblia, dizíamos, cujas páginas
apresentam um sentido oculto, um sentido profundo. Nas suas
camadas rochosas, dobradas, contornadas pelos levantamentos
plutônicos, podereis ler a gênese do globo, as grandes epopeias
da história do mundo antes da aparição do homem.
Os movimentos da crosta terrestre, escritos em torno de vós, em caracteres
formidáveis, vos mostrarão a ação das forças combinadas
criando nossa morada comum. Depois, será o lento trabalho
das águas, gota a gota, cavando os círculos e as gargantas, esculpindo
os colossos de granito. Finalmente, virá o estudo da
flora e da fauna em sua diversidade sem-limite.
Na montanha, as agitações febris, as preocupações da
vida factícia, sufocante das cidades, se dissipam para dar lugar
a um modo de existência mais simples, mais natural.
A altitude é uma escola de energia para aqueles que a cidade não
enfraqueceu bastante. As vastas perspectivas aguçam o olhar.
Os pulmões se dilatam com o ar puro dos cumes. Os obstáculos
estimulam nossos esforços; a ascensão, a escalada nos dão
músculos de aço. Ao mesmo tempo que as forças físicas se
desdobram, as potências intelectuais se reconstituem,
as vontades se retemperam. Habituamo-nos a agir, a vencer, a desprezar
a morte.
Longe dos preconceitos e das rotinas sociais, a alma
se desabrocha livremente. Ela reencontra seu próprio gênio: o
awen dos druidas. Suas seguras intuições lhe dizem que todos
os sistemas são estéreis e que, apenas a grande mãe Natureza,
o grande livro vivo pode nos ensinar a verdade, a beleza perfeita.
Nas horas de recolhimento profundo, seja quando o sol
lança a prodigalidade de sua púrpura sobre a assembleia dos
montes, seja quando a lua espalha sua luz prateada no meio do
formidável silêncio, uma conversa solene se estabelece entre
a alma e Deus.
O Universo inteiro se reflete em nós como num espelho.
O mundo invisível, por uma transição insensível, se religa
ao mundo visível. Acima reina a lei de harmonia que rege a
ambos. E a alma, em sua contemplação, projetada para fora
de si mesma, exteriorizada, de alguma forma, os penetra e os
abraça. Num instante, ela sentiu passar por si o grande arrepio
do Infinito, ela comungou com o pensamento supremo;
compreendeu que este criou os mundos apenas para servir de
degraus para ascensões do espírito.
Sim, é ali o santuário onde a alma se abre e desabrocha
para a visão do grande céu e de Deus, que nele criou a ordem e
a sublime beleza. É ali o templo da religião eterna e viva, cuja
lei inelutável está escrita na fronte das noites estreladas e nas
profundezas da consciência humana.

Leon Denis        " O Grande Enigma"

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